HISTÓRIA DA CHINA | Um Tirano para ser Relembrado

O breve, mas sangrento interregno de Wang Mang (9–23 d.C.)

Munido de armas e do monopólio do uso da força legal, um homem (ou mulher) pode causar danos ao mundo. Adicione ego, arrogância e ditadura à mistura, e o dano se espalhará por toda parte. Até através de gerações. Pois, as fantasias de um tirano se transformam em maldições para a sociedade. Porém, cujos efeitos podem perdurar por muito tempo após a morte do tirano.

Esta é uma lei de ferro da experiência humana. O antigo imperador chinês Wang Mang é um excelente exemplo. Portanto, se está curioso para saber como é uma ditadura absoluta — uma das piores da história — esta história você quererá ler.

Tirano durou pouco

Enquanto as dinastias familiares, que governaram a China por quatro milênios, frequentemente duravam dezenas ou centenas de anos, a Dinastia Xin durou apenas 14 anos. Somente de 9 d.C. a 23 d.C., e Wang Mang foi seu único imperador. Como o Imperador Augusto governava em Roma e Jesus Cristo era criança em Nazaré, Wang ascendeu ao poder na Dinastia Han, como alto funcionário.

Após a morte d’um jovem imperador, sob o qual Wang atuava como regente, este tomou o trono e ordenou o assassinato dos oponentes em potencial. Seu mandato foi um breve e sangrento interregno.

Sendo assim, a queda de Wang e a restauração da Dinastia Han seguiram seu reinado desastroso. Apesar de viver quase 2.000 anos antes de Karl Marx, Wang era ‘marxista’.

O Primeiro ‘Marxista’

Wang era ‘marxista’, pois nacionalizou o suprimento de ouro. Impôs regulamentações draconianas ao comércio e ao empréstimo de dinheiro. Declarou que todas as terras pertenciam ao chefe de Estado. Confiscou e redistribuiu grande parte delas aos pobres e aos politicamente bem relacionados. Contudo, em geral, não sabiam administrá-las. Impôs novos impostos sobre praticamente tudo.

De fato, ele pode ter sido o primeiro governante da história a impor um imposto de renda. Os cidadãos eram obrigados a prestar depoimento anual sobre sua renda. Porém, se fornecessem informações falsas, eram condenados a no mínimo um ano de prisão. Ele introduziu uma nova burocracia e impôs o controle de preços. E, finalmente, travou uma guerra constante contra rebeldes em casa e inimigos no exterior.

Às vezes, Wang Mang é creditado pela abolição da escravidão. Ele fez exatamente isso no ano do seu golpe de Estado (9 d.C.). Entretanto, não por razões humanitárias, mas como um movimento estratégico para enfraquecer os agricultores cujas terras ele estava prestes a confiscar.

Apenas três anos depois, em 12 d.C., Wang reinstituiu a escravidão. Ela permaneceria legal até ser abolida no início do século XX. Mas somente para ser reinstituída sob outros nomes pelo Partido Comunista, começando com Mao Zedong. Pois não esqueçamos dos uigures. Um povo a suportar uma vida dura no que equivale a campos de trabalho escravo na China, neste exato momento.

Genocídio

Pan Ku, um estudioso da história chinesa, afirma em seu livro exaustivo “A História da Antiga Dinastia Han” (traduzido para o inglês em 1938 por Homer H. Dubs), que antes dos rebeldes executarem Wang Mang (23 d.C.): “a população do império havia sido reduzida à metade”. Ele compara a resistência generalizada causada pelas medidas de Wang a uma doença crônica:

Quando os ricos não conseguiam se proteger e os pobres não tinham como se manter vivos, se rebelavam. Logo, se tornavam ladrões e assaltantes. Todavia, como dependiam da vastidão das montanhas e pântanos como refúgio, os oficiais não conseguiam capturá-los… E a infecção se espalhava diariamente.

Sendo assim, nas diversas regiões, muitas vezes às dezenas de milhares, lutavam e morriam. Mas também eram capturados nas fronteiras pelos diversos bárbaros, e sofriam castigos criminais ou fome e epidemias. De modo que as pessoas se devoravam mutuamente. Tudo isso seria ruim por si só. Mas Wang também destruiu o sistema monetário.

Política Monetária Inflacionária

Durante gerações, o povo chinês utilizou moedas wu zhu (algumas feitas de bronze, outras de ouro) produzidas pela Dinastia Han. Eram moedas redondas com um furo quadrado no meio. Contudo, Wang suspendeu a cunhagem de moedas wu zhu, proibiu seu uso e inundou o mercado com uma complexa e desconcertante variedade de moedas fiduciárias. Mas baratas, compostas de metais mais básicos e até conchas de tartaruga e búzios.

O historiador Richard von Glahn relata em “História Econômica da China” que as políticas de Wang:

Expulsaram de circulação moedas e ouro sólidos, desencadeando uma inflação galopante e interrompendo severamente o comércio e a produção industrial.

Essa é a Lei de Gresham em ação, mas 15 séculos antes de Gresham. A confusão econômica e o caos que produziu, resultaram em protestos e greves em massa de trabalhadores e lojistas. Executavam ou exilavam pessoas flagradas usando a moeda tradicional.

No entanto, entre os numismatas (colecionadores de moedas) atuais, as moedas desse breve período são altamente valorizadas. O livro “The Numismatic Legacy of Wang Mang” (1971), de Heinz Gratzer e AM Fishman, apresenta as moedas incomuns de Wang. Elas tinham o formato de facas e pás, em vez do tradicional formato redondo.

O Tirano Corrompido

Gratzer e Fishman também observam que o poder perturbou completamente o próprio Wang:

Suas ações antes de sua ascensão ao trono são as de um sábio erudito, gentil e generoso, preocupado com honra e piedade. No entanto, suas ações como Imperador são de um déspota descuidado, ganancioso e assassino, que desconsiderava o bem-estar dos súditos… Mas também questionam-se ss suas convicções confucionistas. Pois suas ações podem ser vistas como d’um cortesão implacável e manipulador político intrigante. Logo, e não como d’um verdadeiro erudito confucionista.

Ao longo da história, rotineiramente governos que desvalorizam a moeda impõe decretos e penalidades para forçar as pessoas a aceitá-la. Wang Mang elevou a um novo patamar. O historiador Robert Tye relata:

Para tentar forçar a circulação das moedas de espadas, aprovou regulamentações para controlar as pessoas em postos alfandegários, vaus, casas de repouso, portões de cidades e portões de palácios, para deter aqueles que viajassem sem elas [grifo meu].

Pelo crime de usar moeda não autorizada, era sorte ser executado. Porque o governo de Wang também escravizava a família do culpado e as famílias de seus cinco vizinhos mais próximos.

O Tirano Corrupto e ‘Esquecido’

Wang alegou “interesse público” quando confiscou e nacionalizou as reservas de ouro dos cidadãos chineses, no início de seu reinado. Todavia, descobriu-se que ele acumulou grande parte para si. Pois rebeldes que o mataram e saquearam seu palácio, encontraram mais de 150 toneladas do metal amarelo em cômodos diferentes. O povo ficou com as moedas quase sem valor que lhes impusera. Com a restauração da Dinastia Han após sua morte, ressurgiu o antigo, porém confiável dinheiro “wu zhu, como a moeda preferida do país.

O ódio pela ditadura insana de Wang era tão grande que nenhuma de suas supostas “reformas” sobreviveu. As autoridades fizeram o máximo para apagar a memória de seu reinado horrível. Destroçaram o seu corpo e seus sucessores imperiais mantiveram sua cabeça numa caixa. Porém, um incêndio a destruiu, cerca de 300 anos depois.

Alguém ousará argumentar que Wang Mang não mereceu seu destino? Boa sorte.

Leitura adicional

Tradução de Roberto Lacerda Barricelli do artigo “A Tyranny to Remember, publicado por Lawrence W. Reed na Federation for Economica Education (FEE).



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