Um Perigo Fatal: Aliança com a Rússia de Putin

A Nova Aliança com a Rússia de Putin como uma Terceira Roma é o Germe do Cisma a serviço d’um projeto de poder mundial

Nos últimos anos, uma parte significativa do tradicionalismo radical católico passou a manifestar abertamente um fascínio pela ortodoxia russa. Então, exaltando sua aliança com o poder político, sua resistência ao globalismo e sua liturgia venerável. Colocado como supostos sinais de que “a verdadeira Igreja” migrou para o Oriente.

Estratégia de Ruptura do Oriente

Essa leitura não é só romântica: ela é politicamente programática. O patriarca Cirilo de Moscou, aliado explícito de Vladimir Putin, tornou-se símbolo de uma cristandade “sem Vaticano II”. Portanto, atrai os que rejeitam a eclesiologia conciliar. Para esses grupos, Roma já não é confiável. Sendo assim, vêem a ortodoxia russa como uma reserva espiritual alternativa. Ou seja, mais “masculina”, “solar”, “forte”, “antiliberal” – e sobretudo desvinculada da figura do Papa.

A ideia de um conclave alternativo, fora da estrutura oficial da Igreja, já foi abertamente considerada. Inclusive, por figuras como Dom Carlo Maria Viganò. Outros, como Frei Thiago de São José, sugerem misticamente que a Igreja visível foi “ocupada” por falsos pastores. Logo, que apenas uma nova hierarquia “fiel” pode restaurar a verdadeira Igreja.

Esse tipo de teologia – de ruptura e refundação – é inspirado na eclesiologia autocéfala do Oriente. Logo, a comunhão com Pedro se torna irrelevante, e cada igreja local ou nacional se torna seu próprio critério de legitimidade.

Perigosa Nova Aliança

Outro fenômeno preocupante no ambiente tradicionalista é a aliança crescente com o discurso do nacionalismo político. Tratam-no não apenas como opção prudencial, mas valor teológico e critério espiritual.

A publicação no Brasil do livro A Virtude do Nacionalismo, de Yoram Hazony, traduzido por Evandro Fernandes Pontes, foi um marco desse movimento. Hazony é presidente do Herzl Institute, um centro de pensamento neossionista com sede em Jerusalém. Em sua obra, defende a ideia de que o mundo deve ser reorganizado em torno de Estados-nação autossuficientes. Porém, com base em identidades religiosas e culturais tradicionais, ou seja, multipolar.

Embora o texto de Hazony não seja, em si, anticristão, sua cosmovisão é essencialmente judaica. Sendo assim, centra-se no destino do Estado de Israel e na aliança mosaica, e não na nova e eterna aliança em Cristo. Portanto, traduzir Hazony não é o problema, mas elevá-lo a referência de “filosofia política cristã”. E círculos tradicionalistas fazem isso.

O resultado é a substituição do universalismo católico por uma espiritualidade nacionalista. Ou seja, o Reino de Deus cede lugar ao Estado forte, à soberania nacional e à identidade cultural como fundamentos últimos da ordem.

Buscando os Cavalos do Egito

Os mesmos grupos que acusam o Concílio Vaticano II de promover um ecumenismo frouxo com os “infiéis” e os “hereges” são, paradoxalmente, os que mais se empenham hoje em alianças estratégicas com ortodoxos russos, os judeus conservadores e os protestantes fundamentalistas. Desde que compartilhem um ódio comum ao Papa, ao Concílio e à modernidade secular.

Esse “ecumenismo da antipatia comum” não nasce da caridade e da verdade, como ensinado pelo Magistério (cf. Unitatis Redintegratio, Nostra Aetate), mas do ressentimento partilhado. Ele é negativo, não construtivo. Trata-se de uma coalizão de frentes identitárias, unidas não por um credo comum. Mas, pela negação de um inimigo comum: o Vaticano II, a nova evangelização, a teologia moral da dignidade humana e os papas do pós-guerra.

Essa inversão do ecumenismo autêntico resulta em um paradoxo: católicos que se afastam da Igreja para se aproximar de grupos que negam ou relativizam a fé em Cristo. É a velha tentação israelita de “buscar os cavalos do Egito” (cf. Is 31,1). Porém, numa versão política e tradicionalista.

Nova Aliança ‘Ecumênica’

Esses novos ecumenismos convergem num projeto comum! A recriação de uma cristandade artificial, elitista, puramente cultural. Portanto, rejeitam a universalidade da Igreja em favor de uma comunidade de “eleitos”, que supostamente resistiram à “apostasia conciliar”.

O catolicismo se torna um clube fechado de puros. Dos amantes do latim, da monarquia, da estética medieval, dos tratados escolásticos… Contudo, fechados à vida missionária da Igreja, às periferias, aos pecadores que precisam de misericórdia. Essa “igreja paralela” já tem seu martirológio (Lefebvre, Williamson, Viganò), seu magistério (os vídeos e cursos dos “doutores digitais”) e até seus próprios papáveis.

E aqui entra o elemento mais grave, pois já se fala abertamente de um novo conclave. A figura de Viganò é claramente preparada para isso, com tons messiânicos. Frei Thiago de São José fala de uma “nova primavera”. Os grupos tradicionalistas mais radicais especulam em fóruns privados sobre a necessidade de “eleger um verdadeiro Papa”, legítimo e restaurador.

Cisma em Germe

Não se trata mais de crítica. Trata-se de preparar uma nova sucessão apostólica – sem Pedro. É cisma em germe, talvez, prestes a florescer. O que une essas correntes – da ortodoxia russa a Jerusalém, de Fátima aos Estados Unidos trumpistas – é um projeto de cristandade sem Roma. Trata-se de um plano de secessão global. Redesenharão o corpo da Igreja com outra cabeça, outro centro, outro ethos.

Essa não é a Tradição viva da Igreja, como ensinam os Padres e os Doutores. Mas uma Tradição morta, manipulada, sacralizada seletivamente, armada contra a própria Igreja que a gerou. O novo “tradicionalismo” que se espalha em redes, livros e cursos não é católico em sentido pleno. É uma religião cultural, política, fragmentária e ressentida. Seu ecumenismo invertido é um ecumenismo sem caridade! O seu nacionalismo é teológico apenas no nome. A sua fé é desligada da Igreja real – visível, hierárquica, peregrina.



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