Os antinatalistas que exigem que as crianças não sejam vistas nem ouvidas levam-nos em direção a um futuro tranquilo e estéril
Não é segredo que o Ocidente torna-se a cada dia mais hostil às crianças. Por exemplo, escreve-se longos artigos de opinião sobre a ética de levar bebês em aviões. É provável que uma criança pequena e turbulenta receberá os olhares de desaprovação até mesmo nos cafés e restaurantes mais casuais. Casamentos sem filhos tornaram-se mais comuns do que nunca. Sendo assim, a ideia de preservar a paz e a tranquilidade acima de tudo — mesmo ao custo de criar novos seres humanos — agora prevalece. Conquanto cumprir a função mais básica da biologia humana transformou-se em ato estranhamente revolucionário.
O Antinatalismo na França
Talvez em nenhum lugar a batalha entre pais e antinatalistas seja mais clara do que na França. Lá, cada vez mais hotéis e campings começam a excluir menores de 18 anos. Ademais, aumentou a demanda por casamentos sem crianças. Conforme uma pesquisa recente, mais da metade dos franceses quer mais restaurantes, hotéis e opções de transporte público sem crianças. Isso deve-se em grande parte a um aumento no número de crianças malcomportadas. Além disso, 3/4 disseram acreditar que as crianças estão mais travessas agora do que antes, enquanto 86% sentem que os pais permitem que seus filhos perturbem os outros com muita frequência. Seja em público ou em particular.
Veja a discussão sobre a escola Montessori International em Maisons-Laffitte, um subúrbio rico de Paris, na qual os vizinhos entraram na justiça para fechar o parquinho. Mas alegando que o som das crianças rindo e gritando causava uma “perturbação”. Assim como alegaram que não sentavam mais em seus jardins ou terraços e sentiam-se “aprisionados”. Inacreditavelmente, o tribunal concordou com eles, ordenando o isolamento da área. Isto é, aceitando as reclamações dos moradores de que permitir aos alunos correrem nas proximidades prejudicaria sua saúde e reduziria milhares de euros do valor de seus imóveis. Os professores agora devem manter as crianças no pátio da frente da escola, confiná-las à sala de aula ou levá-las a um parque próximo.
Segundo o prefeito local, Jacques Myard, essa cruzada específica contra a natalidade é liderada por “burgueses que não querem filhos”. A França deveria conscientizar-se de que “precisamos de crianças”, disse ele. Também ressaltando que o país precisa de mais 125.000 nascimentos por ano se quiser conter a queda vertiginosa da taxa de natalidade. Ou seja, é importante lembrar que há mais em jogo do que manter os espaços públicos tranquilos. A França vive atualmente taxas de infertilidade recordes, que situam-se em 1,62 filhos por mulher — o menor número desde a Segunda Guerra Mundial.
O Ostracismo de Pais e Mães
Não admira-se que a taxa de natalidade continue caindo, já que ter filhos pode transformar-te num leproso social. Logo, surpreende que um número crescente de jovens espere mais para ter filhos ou recuse a procriar completamente, porque significa exclusão de muitos espaços públicos? Os pais muitas vezes sentem-se pressionados a colocá-los em frente a telas para mantê-los quietos em público. Porém, e ironicamente, levando a mais maus comportamentos dos quais adultos sem filhos tanto reclamam. Parece não ocorrer a essas pessoas que exigir que as crianças permaneçam fora de vista e escondidas só resultará em crianças ainda mais subsocializadas e desajustadas.
O governo francês tentou intervir, com Sarah El Haïry, a alta comissária francesa para a infância, planejando lançar um novo guia do Estado que promove restaurantes, cafés e hotéis particularmente adequados para crianças. Mas também alertou, controversamente, que pode entrar com ações judiciais contra sites de reservas que anunciam férias exclusivas para adultos. Entretanto não é uma boa solução ao movimento anticriança. As empresas privadas devem, é claro, ser livres para oferecer essas experiências aos clientes pagantes que as demandam.
Desejar ter férias sem crianças certamente não equivale, como El Haïry sugeriu, a “violência contra crianças“. No entanto, acerta quando descreve a tendência crescente de acreditar que “crianças são um incômodo”. “Uma criança grita, ri e se mexe”, disse ela à RFI no início deste ano, “institucionalizamos a ideia de que o silêncio e a ausência de crianças são luxos”.
Hostilidade contra Crianças na Europa
Contudo, não trata-se d’ um problema exclusivo da França, pois há crescente hostilidade em relação às crianças em toda a Europa. D’outro lado da fronteira, na Bélgica, esse fenômeno pronuncia-se ainda mais. Conforme relatório de 2023, cerca de 1 em cada 10 restaurantes belgas recusa-se a admitir crianças. No ano passado, um restaurante em Ixelles enfrentou uma investigação específica por não permitir clientes com crianças. O proprietário argumentou que ele e sua equipe “não estavam lá para educar crianças” e que “alguns pais deixam seus filhos comportarem-se como se estivessem num parquinho”.
A tendência também estabeleceu-se firmemente na Espanha. De fato, o país agora tem o 3º maior número de estabelecimentos exclusivos para adultos, depois do Japão e do Brasil. Aqui, ocorrem vários debates públicos sobre se constituem uma escolha comercial razoável ou violação das leis antidiscriminação. Porém, a história é semelhante em Portugal, que tem número crescente de hotéis e resorts sem crianças, vendendo-se como tranquilos, relaxantes e ambiciosos. Apesar da discriminação com base na idade ser explicitamente proibida por lei.
Mas e a Tolerância?
De muitas maneiras, compreende-se que as pessoas estejam cada vez mais frustradas com o mau comportamento das crianças. Afinal, combinar tempo de tela que as crianças passam cada vez mais cedo e o aumento da paternidade permissiva e “gentil” significa uma geração mais recente sem chance de tornarem-se adultos bem ajustados. Mas a solução não é trancar os membros menores e os mais vulneráveis da sociedade e deixar o problema agravar-se.
Se nós quisermos criar crianças socialmente conscientes, educadas e bem integradas, é necessário um pouco mais de tolerância. Pois, inevitavelmente, bebês chorarão, crianças pequenas gritarão e crianças de todas as idades causarão incômodo barulhento e pegajoso. Mas dar espaço para isso também dá aos pais a oportunidade vital de corrigir o comportamento. Isso os ensina a maneira apropriada de agir em público, como ser atenciosos com os outros e como gerenciar suas próprias emoções. Ouvir o filho de outra pessoa gritar, chorar e rir por uma hora é um pequeno preço a pagar para evitar criar mais um pirralho mimado e viciado em iPad.
Ainda mais importante, adotar uma atitude mais amigável às crianças é uma das únicas barreiras entre a Europa Ocidental e o declínio demográfico total. Pois qualquer civilização que acredite em crianças mais bem vistas do que ouvidas, não poderá surpreender-se quando desaparecem completamente. Se não quisermos que nossos países morram silenciosamente, precisamos abrir um pouco mais de espaço para um futuro barulhento.
Publicado originalmente em The European Conservative, intitulado “‘Child-Free’ Zones Are Killing Europe“. Traduzido por Roberto Lacerda Barricelli
É lamentável que, em vez de lutar contra o antinatalismo, a França esteja a lutar contra as próprias crianças. Acho engraçado que eles tenham que fechar um parquinho porque as crianças não estão silenciosas. Será que eles vão proibir os biscoitos de morcego também, por causa do ruído que fazem quando se moem? Acho que a solução não é isolar as crianças, mas ensinar aos pais a arte da paciência, ou talvez simplesmente dar mais espaço para os miúdos – afinal, sem eles, a Europa talvez esteja a ficar um pouco muito silenciosa!Grow a garden pet tier list