O governo federal do México anunciou um imposto de 8% sobre ‘video games violentos’, mas carece de respaldo científico e econômico
O governo federal mexicano anunciou um novo imposto especial de consumo de 8% sobre os ‘video games violentos’. Mas qual a justificativa? Que jogos violentos são responsáveis por comportamentos violentos.
Pânico Injustificado
A violência é de fato um problema grave no México, e o crime organizado deixou partes significativas do país em estado de terror. Mas atacar video games parece uma escolha política equivocada, que ecoa os pânicos morais da década de 1990. Quando jogos como Mortal Kombat desencadearam até audiências no Congresso e manchetes sobre a corrupção juvenil. Logo, levando à criação do sistema ESRB. Todavia, tais pânicos ganham força política mesmo na ausência de evidências.
Para apoiar a alegação de que os video games inspiram violência, o governo citou apenas um único artigo acadêmico. Porém, nenhuma revisão ampla da pesquisa, nenhuma comparação de descobertas diversas e nenhum dado sólido. Contudo, uma falta de rigor importante. Pois, uando um governo intervém nos mercados, o ônus da prova recai diretamente sobre seus ombros. Ao não fundamentar suas alegações, o Estado mexicano mina a legitimidade de sua proposta.
A liberdade exige instituições que protejam os direitos de propriedade e garantam que não retrinjam-se as trocas voluntárias arbitrariamente pelo Estado. Quando o governo deseja interferir nessas trocas, deve demonstrar que isso não é somente justificado, mas necessário. Istp é, não basta declarar que uma atividade pode gerar efeitos colaterais negativos. Portanto, o governo deve provar que, na ausência de intervenção, prejudicaria gravemente terceiros. O ônus da prova recai sobre o Estado, não sobre o cidadão. No caso do imposto violento sobre video games, o governo mexicano ficou muito aquém desse padrão.
Imposto Pigoubiano sobre Video Games
A justificativa utilizada pelo governo ilustra a ideia d’um imposto pigouviano. Um conceito econômico que leva o nome do economista Arthur C. Pigou, a ideia é que, quando atividades privadas geram externalidades negativas — custos que repercutem-se em terceiros — o Estado pode impor imposto para refletir tais custos. Se jogos violentos realmente fomentam agressão ou dano social, representa um custo para a sociedade. Por isso, um imposto corretivo poderia, em teoria, fazer sentido.
Mas o governo precisaria primeiro provar o seguinte:
- Os video games violentos de fato geram externalidades negativas mensuráveis?
- Mesmo que aconteça, o governo demonstrou que um imposto de 8% é a ferramenta e a taxa corretas para compensá-los?
A resposta para ambas as perguntas é NÃO.
Mesmo que se aceite que video games violentos causam algum nível de dano social, o governo mexicano não demonstrou que a proposta de imposto de 8% seja uma avaliação justa. O imposto alega ser corretivo. Mas é somente simbólico e voltado para a arrecadação.
Agressão vs Violência
A literatura sobre jogos violentos e violência é dividida e matizada. É importante distinguir entre agressão — frequentemente medida em tarefas de laboratório ou pesquisas — e crimes violentos reais. Muitos estudos mostram pequenos aumentos na agressividade de curto prazo após jogos violentos. Mas faltam evidências que os vinculem à violência criminal.
Qualquer pessoa em busca de evidências de que video games violentos alimentam a agressão encontrará estudos para apoiar-se. A meta-análise de 2010 de Anderson e colegas relacionou jogos violentos a aumentos de pensamentos agressivos e menor empatia. Da mesma forma, o trabalho de Matt DeLisi, de 2013, sobre os jovens encarcerados encontrou correlações entre jogos violentos e delinquência. Todavia, sugerindo que, em populações já de alto risco, os jogos podem adicionar outro incentivo ao comportamento antissocial.
Mas há uma diferença crucial entre experimentar sentimentos agressivos e cometer crimes violentos. Estudos que buscam descobrir uma ligação causal entre violência criminal explícita e video games não dão em nada. Christopher Ferguson, num conjunto de trabalhos que abrangem de 2007 a 2019, descobriu que, corrigindo o viés de publicação — periódicos favorecendo estudos que relatam efeitos significativos —, a suposta conexão desaparece em grande parte. Assim como alguns economistas encontraram um padrão oposto.
Estudos Criminais e Atividade Econômica
Num estudo de 2016 usando dados de crimes nos EUA, Cunningham e colegas descobriram que em semanas com maiores vendas de jogos violentos, as taxas de crimes violentos na verdade caíram ligeiramente. O tempo gasto jogando mantém algumas pessoas longe de atividades mais arriscadas. Por conseguinte, mais recentemente, estudo em larga escala de Przybylski e Weinstein (2019), numa investigação pré-registrada no Reino Unido, não relatou ligação entre jogabilidade violenta e agressão adolescente.
Então, sim, jogos violentos podem despertar emoções ou desencadear breves momentos de agressão. Mas não parecem transformar os jogadores em criminosos violentos. Na verdade, as evidências sugerem potencial para afastar as pessoas do crime. Segundo Pigou, não justificaria um imposto de forma alguma. Seria um apelo a subsídios!
O México tem mais de 72,6 milhões de jogadores e um mercado de jogos que movimenta US$2,6 bilhões ao ano. Entre 2015 e 2024, o número de domicílios com consoles aumentou de 3,6 milhões para 8,1 milhões (125%). Logo, os jogos são uma indústria em expansão, gerando empregos, atraindo investimentos e fomentando a inovação.
Impacto do Imposto
Analistas da GameMetron — uma empresa mexicana de tecnologia jurídica especializada na indústria de video games e eSports — estimam que um título com preço de MX$ 100 custaria MX$ 124 após o novo imposto. Consumidores que avaliam o jogo acima de MX$ 100, mas abaixo de MX$ 124, não o comprarão mais. Essas transações perdidas significam que os consumidores perdem prazer, as empresas perdem vendas e o governo perde receita tributária.
Ademais, dsenvolvedores e editoras podem reduzir investimentos ou atrasar lançamentos no México, percebendo o mercado como menos lucrativo. Estúdios nacionais menores, que já operam com suas margens reduzidas, ver-se-ão particularmente em desvantagem. O imposto pode, paradoxalmente, reduzir as receitas do IVA. Pois o menor volume de vendas anula os ganhos da sobretaxa.
Portanto, o imposto sobre video games violentos falha tanto no plano científico quanto no econômico. Não é respaldado por evidências sólidas de danos, tampouco calibrado como uma correção pigouviana. Corre o risco de prejudicar uma indústria dinâmica, aumentar os preços ao consumidor e distorcer incentivos. Assim como oferece benefícios sociais insignificantes. Mais importante ainda, corrói o princípio de que intervenções governamentais em mercados livres devem justificar-se com evidências sólidas. Impor um imposto arbitrário a um setor cultural e tecnológico com base em correlações fracas é substituir a análise por preconceito.
Publicado originalmente na FEE, intitulado “Mexicans Must Pay to Play?“. Traduzido por Roberto Lacerda Barricelli.