Finalmente os Britânicos Lidarão com as Gangues de Aliciamento?

As vítimas das gangues de aliciamento merecem justiça. Será que o mesmo establishment que as traiu conseguirá realmente fazer justiça agora?

Demorou décadas, mas só agora estamos começando a entender a extensão total das gangues de aliciamento da Grã-Bretanha. Pelo menos desde a década de 1980, meninas brancas da classe trabalhadora são vítimas de estupro, tráfico, sequestro e tortura nas mãos de homens, em sua maioria de origem paquistanesa. Em alguns casos, homens adulto manipulavam e se diziam namorados das vítimas, que eram meninas de 10 anos. Eles as aliciavam com drogas, álcool, roupas e outros “presentes”. Depois, repassavam para abusos sexuais por outros homens da comunidade.

Essas meninas são quase sempre oriundas das camadas mais vulneráveis ​​da sociedade. Moram em cidades carentes e desindustrializadas como Rochdale, Telford e Rotherham. Frequentemente advindas de famílias desestruturadas. Muitas viviam em lares de acolhimento. Repetidamente, as autoridades locais — assistentes sociais, policiais e cuidadores — falhavam em protegê-las, apesar de ser evidente o abuso.

Gangues de Aliciamento: Escândalo Nacional

Este foi um escândalo de proporções inimagináveis. A indignação cresce, com razão, enquanto ativistas e jornalistas se esforçam para chamar mais atenção. Porém, não apenas ao fato de que milhares de meninas sofreram abusos horríveis, mas também de que as autoridades locais ignoraram esses crimes. 

Apesar disso tudo, o primeiro-ministro do Reino Unido, Keir Starmer, e seus parlamentares trabalhistas passaram os últimos seis meses negando que haja qualquer necessidade de um inquérito nacional sobre o escândalo das gangues de aliciamento. Sua Secretária de Estado da Proteção, Garantias e Violência Contra as Mulheres e Meninas, Jess Phillips , levantou o debate mais recente sobre a necessidade de um inquérito sobre gangues de aliciamento em janeiro. Naquele momento, rejeitou os apelos do Conselho de Oldham — uma área que abrigava uma rede particularmente desagradável de exploração infantil — para realizar um.

Em resposta à indignação gerada em reação à rejeição de Phillips, Starmer acusou aqueles que chamavam a atenção à questão de incitarem uma “onda de extrema direita”. Ele então incitou seus parlamentares a rejeitarem uma proposta dos conservadores, que criaria um inquérito nacional. Recentemente, a deputada trabalhista Lucy Powell declarou na BBC Radio 4, que o foco nas gangues de aliciamento era soprar um “apito de cachorro”. O Partido Trabalhista repetidamente desviou o olhar das vítimas da maneira mais vergonhosa. 

Inquérito Nacional

Em vez de lançar o inquérito nacional que exigia o clamor popular, Starmer encarregou a Baronesa Louise Casey de conduzir uma “auditoria rápida” da exploração infantil por gangues no Reino Unido. Foi este relatório, afirma Starmer, que o fez mudar de ideia. No último fim de semana, ele anunciou que haverá um inquérito nacional sobre as gangues de aliciamento, conforme recomendação de Casey. Uma Comissão Independente, com poderes para obrigar testemunhas a fornecer provas, supervisionará o Inquérito. Starmer pode defender tal reviravolta baseado no fato do relatório de Casey tê-lo convencido. Contudo, é difícil ignorar ocorreu num momento em que tanto os Conservadores, como o Reform UK, estão à frente do Partido Trabalhista nas pesquisas eleitorais.

Desde a eleição de 2024, os dois partidos pressionam fortemente pelo inquérito nacional. Em janeiro, os Conservadores tentaram legislar por um Inquérito Nacional no parlamento , mas os parlamentares trabalhistas rejeitaram. Ao mesmo tempo, o líder do Partido Reformista Nigel Farage prometeu que seu partido financiaria seu próprio inquérito nacional se o governo não o fizesse.  

No entanto, as conclusões desse relatório, publicado na íntegra esta semana, são poderosas. Elas expõem tanto a negligência como a crueldade absoluta, que levaram à impunidade dos abusadores e retrataram as vítimas como indignas de confiança. O nível de traição das vítimas é verdadeiramente repugnante.

Proteção aos Agressores Muçulmanos

Em uma seção, Casey aponta que as meninas envolvidas não foram tratadas como crianças, mas como adultas capazes de ter relacionamentos sexuais com homens adultos. Retiraram ou diminuíram as acusações de estupros em alguns casos, por causa do argumento de que as meninas de 13 a 15 anos tinham consentido com os relacionamentos e ‘amavam’ os seus abusadores. As autoridades rejeitaram e descartaram meninas que denunciaram as agressões sexuais à polícia, como “prostitutas infantis”, que se colocaram em situações perigosas.

Uma das conclusões mais significativas do relatório de Casey é o quanto a preocupação em relação à etnia dos agressores sexuais impediu as autoridades de proteger as meninas vítimas de abuso. Bouve um esforço da polícia, dos serviços sociais e dos conselhos locais para encobrir ou diminuir o fato de que os agressores eram quase exclusivamente homens muçulmanos e de origem paquistanesaCasey verificou e descreveu a censura às referências ao agressor ser “paquistanês” num dos arquivos infantis. De fato, Casey constatou o não registro da etnia para dois terços dos agressores de exploração sexual infantil. 

Casey, por fim, recomendou que o governo do Reino Unido tornasse obrigatório o registro da etnia e nacionalidade em casos de abuso sexual infantil e exploração criminosa. Ela também sugeriu que o Estado examine exatamente o porquê a exploração em massa, pelas gangues de aliciamento, prosperou entre um determinado grupo demográfico. Porém, provavelmente a natureza insular e unida dos paquistaneses na Grã-Bretanha permitiu a continuidade desses crimes por tanto tempo e em escala tão grande.

Negação da Realidade pela esquerda Trabalhista

A realidade de que, em todo o país, um grupo étnico minoritário estava se envolvendo em atos horríveis de abuso contra meninas brancas da classe trabalhadora aterrorizou o establishment. Proteger as meninas não era a preocupação principal. Mas garantir que as chamadas tensões comunitárias não fossem inflamadas. Nas áreas afetadas, a autoridades relutavam em tratar com seriedade os relatos de gangues paquistanesas, pois tinham medo das acusações de racismo. No Relatório Jay de 2014 sobre exploração infantil, funcionários do Conselho Municipal de Rotherham “descreveram seu nervosismo em identificar as origens étnicas dos perpetradores por medo de serem considerados racistas” e alguns até “se lembraram de instruções claras de seus gerentes para não fazê-lo”. Assim, as gangues de aliciamento continuaram lamentavelmente subnotificadas, com muitas sendo autorizadas a continuar com impunidade efetiva. 

O próprio conceito de gangues de aliciamento foi completamente descartado. Logo, trataram como uma teoria da conspiração de extrema direita ou pânico moral. Contudo, evidências tornaram-se claras demais para continuarem ignorando. Nos primeiros dias das investigações sobre esse escândalo, qualquer pessoa que se manifestasse era acusada de islamofobia ou racismo. Em 2011, o falecido Andrew Norfolk foi um dos primeiros jornalistas a descobrir e reportar o que estava acontecendo em Rotherham. Por isso, difamaram ele como “antimuçulmano” e “alimentador d’uma agenda racista fortalecida“. 

Quando a deputada trabalhista de Rotherham, Sarah Champion, ecoou as preocupações de Norfolk sobre os acontecimentos, ela foi forçada a renunciar ao cargo como ministra da igualdade, em 2017. Da mesma forma, Maggie Oliver, uma ex-detetive da polícia da Grande Manchester, denunciou a investigação inadequada das forças de segurança sobre gangues de aliciamento em Rochdale nos anos 2000. Porém, a excluíram d’um relatório ao qual ela seria uma grande colaboradora. 

Extensão Desconhecida das Gangues de Aliciamento

Mesmo agora, após inúmeras reportagens detalharem a horribilidade de tais crimes, alguns negam ainda a discutir o quanto a etnia e a religião foram influenciaram nos acontecimentos. O The Guardian indagou em voz alta esta semana a Casey se falar demais sobre a relevância desses aspectos resultará em tumultos, como os de Southport, em 2024. 

Há enormes lacunas nos dados, como demontra o relatório. Ou seja, não temos ideia de quantas meninas foram obrigadas a suportar esses horrores, ou da extensão do problema. Mas algumas estimativas apontam às dezenas de milhares de vítimas, em mais de 50 cidades do Reino Unido. É provável que essas gangues operem até hoje. Provavelmente continuam, incentivadas por uma cultura de politicamente correto e pelo medo de acusações de islamofobia

Talvez a parte mais frustrante do relatório Casey seja o fato de nada dele ser notícia, por si só. Esta análise se baseia em 15 anos de relatórios e investigações locais sobre gangues de aliciamento em todo o país — com pouquíssimos resultados de mudanças significativas. Até o momento, não responsabilizaram os policiais, assistentes sociais e autoridades locais, que escolheram proteger o ‘multiculturalismo’, em detrimento de meninas vulneráveis. 

Um inquérito nacional é bem-vindo, claro. Mas, considerando a enorme extensão com que as gangues de aliciamento foram ignoradas por sucessivos governos, por que alguém confiaria que desta vez seria diferente?

Traição e Desconfiança

Durante décadas, o Estado britânico — incluindo tanto o Partido Trabalhista como o Conservador, bem como o aparato jurídico e de assistência social — conspirou para encobrir um dos piores e mais abrangentes crimes da memória recente. Decidiu deliberadamente sacrificar meninas vulneráveis ​​em nome da promoção do multiculturalismo e difamou qualquer pessoa que se importasse, chamando-a de islamofóbica e racista.

As vítimas das gangues de aliciamento merecem desesperadamente justiça. Agora, será que o mesmo establishment que as traiu conseguirá realmente fazer justiça? 

Tradução de Roberto Lacerda Barricelli do artigo “Can Britain Finally Reckon With Its Grooming Gangs?“.




Para Você

One thought on “Finalmente os Britânicos Lidarão com as Gangues de Aliciamento?

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Verified by MonsterInsights