Ao tirar nossos meios de autodefesa e se recusar a fornecer um substituto adequado, as zonas livres de armas violam nosso direito à Vida
Vamos começar com um experimento mental. Suponha que eu o empurre para águas profundas como parte d’uma aula de natação. Como você não sabe nadar, começa a tentar desesperadamente se manter à tona, mas sem sucesso. Agora, suponha ainda que eu não faça nada para resgatá-lo e, como resultado, você afogue-se. Logo, minhas ações neste cenário equivalem a assassinato. Pois o coloquei, intencionalmente, numa situação de grande vulnerabilidade e, em seguida, recusei-me a cuidar de você. Seus direitos foram flagrantemente violados pela minha recusa em fazer qualquer coisa. Isso ocorre nas Zonas Livres de Armas.
O princípio moral por trás deste experimento mental é: se eu, conscientemente, fizer com que você viva num estado de grande necessidade ou vulnerabilidade. Então, sou responsável por prover suas necessidades. Sendo assim, se não fizer, serei negligente, e se minha negligência levar à sua morte, serei culpado de assassinato.
Este princípio está consagrado no sistema jurídico como parte da doutrina do perigo criado pelo Estado. Ou seja, se o governo fizer algo que coloque alguém em situação de perigo, tem a responsabilidade especial de zelar pela segurança desse indivíduo. Porém, se não fizer isso, podemos o responsabilizar por quaisquer danos resultantes.
O que isso tem a ver com zonas livres de armas?
Este princípio tem relevância direta para as chamadas “zonas livres de armas”. Trata-se de locais onde o governo, usando a ameaça de punição para forçar o cumprimento, proibiu o porte de armas de fogo. Entretanto, ao exigir coercitivamente nosso desarmamento, o governo intencionalmente prejudica nossa capacidade de nos proteger de forma eficaz e razoável.
N’outras palavras, colocou-nos numa posição de maior vulnerabilidade em relação à nossa autoproteção. Portanto, se não compensar o déficit de proteção que criou, então, o governo violou nosso direito à autoproteção. Isto é, se alguém acabar ferido ou morto como resultado, o governo é culpado de violar o direito à Vida dessa pessoa.
Há um grande conjunto de evidências mostrando que armas são muito eficazes em produzir resultados bem-sucedidos quando usadas em autodefesa. Por causa disso, há forte presunção moral em favor de permitir que indivíduos portem armas em público. Afinal, nosso direito à vida nos segue aonde quer que vamos. Portanto, o direito de defender nossas vidas também deve nos acompanhar.
Se o governo deve anular essa presunção e nos dizer que não podemos portar nossas armas num local específico. Então, deve ser responsável especial de compensar o déficit de autoproteção que criou. Por conseguinte, deve fornecer alguma alternativa que sirva à mesma função que minha arma serviria se me autorizassem a portá-la.
Supre-se esse déficit às vezes, como em aeroportos, tribunais e prisões. No entanto, a grande maioria das zonas livres de armas são locais nos quais o governo claramente não cumpre sua obrigação especial de fornecer aos seus cidadãos um padrão elevado de proteção. A presença d’uma força policial comum não é suficiente. Pois as respostas policiais quase sempre ocorrem após a ocorrência d’um crime.
Quando os segundos importam, a polícia está a minutos de distância
De fato, conforme dados da Pesquisa Nacional de Vitimização Criminal, denunciou-se à polícia somente 47,3% de todos os crimes pessoais em 2008. Desses crimes, só 28% das reações policiais ocorreram em até cinco minutos após a denúncia 30,3% em até seis a dez minutos. Enquanto até 33,5% em até onze minutos a uma hora após a denúncia.
Alguns opor-se-äo, argumentando que a chance de alguém ser vítima d’um crime é tão rara que o governo não erra ao recusar-se a fornecer um padrão mais elevado de proteção. Mas essa objeção não tem sentido algum. A razão para alguém carregar uma arma é justamente aquelas raras situações nas quais torna-se muito necessária.
Nosso direito de nos defender não depende do risco de tornarmos-no vítimas. Os direitos se baseiam na dignidade do indivíduo, não em médias estatísticas. Conquanto a legítima defesa é uma liberdade que possuo enquanto um ser humano. Não perco esse direito só porque as circunstâncias em que precisarei usá-lo são estatisticamente raras. Caso contrário, tal argumento servitia para descartar qualquer tipo de legítima defesa.
Zonas Livres de Armas não aceita exceções
Outra objeção é que o mesmo diríamos de lançadores de foguetes, metralhadoras, mísseis e armas nucleares. Ao restringir essas armas, pode-se argumentar que o governo “prejudica” nossa capacidade de nos defender. Mas seria absurdo dizer que viola nossos direitos. Então, por que as armas de fogo são exceção? Essa objeção falha por uma razão simples: o uso de lançadores de foguetes, metralhadoras, mísseis e armas nucleares não são métodos proporcionais para um indivíduo defender-se contra ameaças que razoavelmente espera encontrar. Mas revólveres e rifles de assalto, sim.
Todavia, onde isso nos deixa? Argumentei que a maioria das zonas livres de armas viola nosso direito à autodefesa. Isso ocorre porque o governo claramente não cumpre sua obrigação ainda maior de nos proteger nessas áreas. Portanto, se estiver correto, deveríamos ter permissão para portar armas na maioria dos locais públicos.
Publicado originalmente na FEE, sob o título “The Moral Problem With Most Gun Free Zones“. Traduzido por João Pedro Moscatti.