O Perigoso Tempo Perdido em Jogos e Interpretações

black and gray dice on white board game

Jogos nos quais o tempo perdido é em manter-se dentro de certos personagens costumam ser os mais perigosos

Gustave e Sophie não se falavam há quatros anos. Ainda havia sentimentos entre ambos, mas o estranhamento falava mais forte. Porém, aquele dia era diferente. E Gustave estava nervoso como não poderia estar em nenhuma outra ocasião. Ele sabia que era o seu último dia para falar com Sophie. E ela também. Os dois tinham brigado porque discordavam sobre ter ou não filhos. E a briga dos dois levou-os à separação, sem permitir que pudessem se aproximar de outra pessoa. No máximo, Gustave adotou várias crianças como seus aprendizes. Porém, não era a mesma coisa.

Naquele dia, armado com uma rosa, ele foi ao píer e passou o último dia com sua amada. As palavras trocadas e as mãos que se tocaram falaram tudo. Ao pôr-do-sol, ele a viu morrer.

Tragédia e Jogos

Para os que ainda desconhecem, trata-se do enredo base com que Clair Obscure Expedition 33 começa. Esse trecho aproximado equivale ao tutorial inicial do jogo. Como o jogador controla Sophie por alguns trechos, os desenvolvedores permitem que a morte de Sophie seja mais pessoal. Como em outros jogos.

É similar ao caso de Aerith, em Final Fantasy VII. O fato de uma personagem controlável pelo jogador ser morta pelo vilão deixa tudo nos jogos mais pessoal. E não é sem motivo que o título recebeu o tratamento premium que recebeu. Há uma alegria especial em derrotar o vilão exatamente porque ele matou alguém querido pelos jogadores.

Ainda que filmes e séries possam fazer algo similar, o fato de o jogador poder controlar um personagem torna tudo mais pessoal. É por isso, também, que RPGs (literalmente, jogos de interpretação de papeis) podem ser perigosos: fingir que se é alguém que não se é leva a uma perda de tempo absurda.

Mídias Digitais

O problema principal é que muitos olham para os problemas em jogos digitais e se esquecem de outras situação análogas em que há interpretação de papeis. A política e o mercado de digital influencers são outras áreas onde isso acontece.

Inclusive, essa é uma das razões pelas quais os políticos não conseguem fazer certas coisas: muitos precisam interpretar determinados papéis. Alguns, inclusive, interpretam o papel de oposição. Outros, interpretam um papel conforme a situação.

O objetivo é atrair votos. No caso dos influencers, o objetivo é atrair audiência, que atrai dinheiro. E quando a máscara cai, trata-se de uma tragédia. E não há porque pensar que o caso da influencer vegana que comeu peixe foi um caso isolado na interpretação de papéis.

Antropologicamente, fala-se em “papeis sociais”, uma teoria que tenta explicar porque as pessoas se comportam de determinadas formas em determinados contextos e mudam a forma de agir em outros. O mau-caratismo, não raro, é uma explicação melhor.

Arte e Catarse nos Jogos

Assim como outras formas de arte, jogos permitem catarse. Porém, não se pode negar que podem viciar e a pessoa pode querer escapar para Nárnia e fugir da realidade.

O ponto é que existem outras fugas e, não raro, o que se faz com jogos é buscar um bode expiatório para esconder as reais causas dos problemas que afligem a sociedade. Jogos, como muitas outras formas de entretenimento, não raro são reforço de comportamento que causadores.

Por isso o final de Expedition 33 é tão impactante. Depois de tanto drama (a narrativa é realmente dramática, no sentido de emocionante em vários aspectos), o jogador precisa tomar uma decisão que abala o universo narrativo de maneira muito profunda.

E não se trata de uma decisão fácil. Porém, a realidade difícil deve ser preferível à ilusão fácil.



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