“Eu queria salvar meio milhão de meninos do nosso lado… Nunca perdi o sono por causa da minha decisão.” — Harry Truman, sobre as Bombas Atômicas (citado em Alfred Steinberg, The Man From Missouri (Nova York, 1962), p. 259)
Estima–se que houve 416.480 mortes de militares americanos na Segunda Guerra Mundial. Assim, o que somos levados a acreditar pela afirmação de Truman de que as bombas atômicas salvaram 500.000 (ou muito mais) vidas americanas? Que se os EUA invdissem o Japão, mais americanos morreriam em tais ações do que em todos os teatros de operações da Segunda Guerra Mundial combinados. Além disso, antes das bombas, Truman, Stimson e Marshall aprovariam um plano de invasão (como de Honshu e Kyushu) se realmente acreditassem em 500.000 mortes americanas? Mas também em oposição às alternativas mais prováveis antes da invasão?
As histórias das Bombas Atômicas e do Peixe Grande
Assim como a tendência aos exageros sobre “quem pegou o maior peixe” crescer a cada nova história. Parece que o número de vidas americanas supostamente salvas pela alternativa das bombas atômicas crescem a cada nova versão! James B. Conant — querendo adiantar-se à história — convenceu o Secretário de Guerra Stimson a publicar artigo justificando o uso das bombas atômicas. No artigo da Harper’s (1947), afirmava-se que a bomba provavelmente evitou “mais um milhão” de baixas americanas. No entanto, em 1946, o Levantamento de Bombardeio Estratégico dos Estados Unidos publicou a seguinte avaliação:
Com base em uma investigação detalhada de todos os fatos e apoiada pelo depoimento dos líderes japoneses sobreviventes envolvidos, a opinião da Pesquisa é que certamente antes de 31 de dezembro de 1945, e com toda a probabilidade antes de 1º de novembro de 1945, o Japão teria se rendido mesmo se as bombas atômicas não tivessem sido lançadas, mesmo se a Rússia não tivesse entrado na guerra e mesmo se nenhuma invasão tivesse sido planejada ou contemplada . (ênfase adicionada)
À luz dessas evidências iniciais do pós-guerra, duvida-se que uma força tão derrotada causaria 500.000 mortes americanas ou mais. Logo após Nagasaki, Churchill afirmou que os bombardeios salvaram bem mais de 1.200.000 vidas aliadas. Em 1953, Winston Churchill escreveu: “Para reprimir a resistência japonesa homem por homem e conquistar o país metro por metro, pode muito bem exigir a perda de um milhão de vidas americanas e metade desse número de britânicas…” ( grifo nosso). Porém, baseado nas memórias da Batalha de Okinawa (65.631 baixas; 7.374 mortes). Portanto, nada perto de 500.000 mortes americanas, muito menos “um milhão”.
Truman aumentou os Números
Enquanto estava na Casa Branca, Truman geralmente colocava o número de vidas americanas salvas em torno de 250.000 e, ocasionalmente, em torno de 200.000. Mas depois de deixar a Casa Branca, Truman começou a aumentar o número para 300.000 vidas nos primeiros rascunhos de suas memórias. Em 1955, Truman escreveu suas Memórias e, no volume 1 — Ano das Decisões (1955) — escreveu: “O General Marshall disse-se que custaria meio milhão de vidas americanas forçar a rendição do inimigo em seu território”. Truman escreveu carta (1953) que aparece em The Army Air Force in World War II, Vol. 5, The Pacific, Matterhorn to Nagasaki, June, 1944-Agosto, 1945. Na qual declarou:
Perguntei ao General Marshall [em Potsdam] quanto custaria em vidas desembarcar na planície de Tóquio e em outros lugares do Japão. Sua opinião era que tal invasão custaria no mínimo 250 mil baixas americanas, e poderia chegar a 1 milhão , com um número igual de inimigos. Os outros militares concordaram. (grifo nosso)
Harry Truman (1953)
Observe que Truman admite que o General Marshall falou de baixas, não de mortes. Com base na proporção média de baixas para mortes no Pacífico, mplicaria em 50.000 a 250.000 mortes, não 500.000 que Truman alegaria em 1955. Por essas e outras razões, Barton J. Bernstein argumenta que “a reivindicação de meio milhão foi criação do pós-guerra”.
Uma Mentira que Cresceu
Embora injustificada a alegação de 500.000 vidas americanas salvas por evitar uma invasão, por causa das bombas atômicas, os números contrafactuais continuaram a crescer. Ademais, uma amostra de livros didáticos do ensino médio relatou que a invasão, em vez das bombas atômicas, causaria a perda de um milhão de vidas americanas. No Washington Post (1º de dezembro de 1991), o presidente George H. W. Bush afirmou que as bombas atômicas “poupararam milhões de vidas americanas”.
Finalmente, Tom Lewis escreveu Atomic Salvation: How the A-Bomb Attacks Saved the Lives of 32 Million People (Salvação Atômica: Como os Ataques com Bomba Atômica Salvaram as Vidas de 32 Milhões de Pessoas). Descrito numa resenha favorável como assumindo a dicotomia entre bombas atômicas ou invasão sem outras opções. Como carente d’um índice, limitado a fontes em inglês, construído principalmente com base em obras secundárias e fontes primárias de pouca compreensão sobre a tomada de decisões americanas — contando o total de vidas salvas — americanas, japonesas e outras.
Alternativas e cenário de pior caso
Todavia, se as alegações contrafactuais de vidas salvas pareçam plausíveis, dada a crueldade da guerra no Pacífico, e embora não devamos culpar ninguém pela estimativa equivocada em geral. E embora a história deva justiça ao que sabia-se na época, as afirmações confiantes de mais de 500.000 vidas americanas salvas pelas bombas atômicas sõa mais que duvidosas. Mas diretamente contrárias às evidências e estimativas da época. Houve vários cenários de invasão e, na pior das hipóteses, as estimativas de mortes americanas nem chegaram perto de 500.000. Aliás, Gar Alperovitz desenterrou muitas dessas evidências em seu livro “Diplomacia Atômica” (1965) e estudos subsequentes.
Em junho de 1945, os planejadores militares dos EUA estimaram que, no pior cenário, o maior número de mortes americanas num plano de invasão chegaria a 46.000. Em 15 de junho de 1945, o Comitê Conjunto de Planos de Guerra (JWPC) projetou estimativas para três cenários de invasão:
- 1) um ataque ao sul de Kyushu, seguido por um ataque à planície de Tóquio (40.000 mortos);
- 2) um ataque ao sul de Kyushu, seguido pelo noroeste de Kyushu (25.000 mortos); e
- 3) um ataque ao sul de Kyushu, seguido pelo noroeste de Kyushu e, em seguida, à planície de Tóquio (46.000 mortos).
Sendo assim, Barton J. Bernstein concluiu:
Claramente, todas essas estimativas ficaram muito aquém — em pelo menos 454.000 — das estimativas posteriores de 500.000 vidas americanas. De fato, no início de junho de 1945, quando um leigo sugeriu um número elevado de meio milhão de mortos, os planejadores do exército responderam sem rodeios em um relatório secreto: “[tal] perda estimada… é excessivamente alta”.
Estimativas dos Oficiais Militares Americanos
Em escritos particulares após Hiroshima e Nagasaki — portanto, tendo poucos motivos para exagerar os números —, os líderes militares americanos concordaram que a estimativa de 500.000 vidas americanas salvas era excessivamente alta. Além disso, o General MacArhtur acreditava que as baixas e mortes não seriam tão altas quanto as da Normandia e Okinawa (65.631 baixas; 7.374 mortes). Mas na verdade, estimou que o total de baixas seria bem inferior a 100.000, num comunicado à Casa Branca pelo General Marshall.
Até mesmo o mais pessimista Almirante Leahy — exagerando erroneamente as estimativas de baixas de Okinawa para referência — sugeriu que a maior estimativa de baixas em Kyushu seria possivelmente de 230.000. Contudo, outras estimativas, baseadas em documentos históricos semelhantes, argumentam que: “mesmo no pior cenário, [vidas americanas salvas] seriam da ordem de dezenas de milhares, em vez de centenas de milhares”.
O consenso acadêmico atual afirma que a guerra terminaria num tempo relativamente curto, mesmo sem as bombas atômicas. Conquanto as invasões alternativas ao Japão seriam improváveis e que Truman e seus conselheiros sabiam dessas opções. Outro acadêmico, utilizando fatos disponíveis na época, argumenta sobre os resultados no pior cenário improvável:
Se este “pior cenário” ocorresse — isto é, se as bombas atômicas não funcionassem ou não as usassem, e se o Japão de alguma forma resistisse além de 1º de novembro de 1945, e se realizassem a invasão bem-sucedida do sul de Kyushu, e se os russos entrassem na guerra em agosto (como fizeram) e enfrentado os japoneses na Manchúria e na Coreia, e se naquele ponto os japoneses se rendessem— então uma estimativa razoável de mortes americanas quase certamente não ultrapassaria 20.000 e provavelmente seria menos do que 15.000 (5.000 para perdas aéreas e navais antes da invasão, não mais do que 10.000 durante a invasão de Kyushu, e uma provisão adicional de 5.000 para perdas imprevistas). (ênfase adicionada)
Conclusão sobre a Salvação pelas Bombas Atômicas
No entanto, embora difícil projetar para trás uma história contrafactual que não aconteceu, o fato é que:
Quando Truman aprovou a ordem de 24 de julho para usar bombas atômicas, jamais recebera um relatório de alto nível sugerindo meio milhão ou mesmo um quarto de milhão de mortos nos EUA.
Ou seja, nenhum planejador militar dos EUA entre 05/1945 e período subsequente aos bombardeios estimou o número de vidas americanas salvas em algo próximo. Para resumir, “O mito de 500.000 [e muito menos milhões de] vidas americanas salvas parece, portanto, não ter base em fatos”.
Artigo publicado originalmente no Mises Wire, do Mises Institute, sob o título “Atomic Salvation: Did the Atom Bombs Save 500,000 to 32 Million Lives?“. Traduzido por Roberto Lacerda Barricelli.