Uma homenagem a Leonard E. Read, fundador da FEE e que identificou o que é indispensável para um povo livre e pessoas livres
Leonard E. Read, fundador da FEE, completaria 127 anos hoje. Em homenagem a este seu aniversário, destacamos esta homenagem à sua vida, escrita pelo Presidente Emérito da FEE, Lawrence Reed, e publicada em 1º de dezembro de 2018.
Este é o primeiro de uma série de ensaios publicados ao longo do mês de dezembro de 2018 em comemoração ao sexagésimo aniversário do ensaio “Eu, Lápis”, de Leonard E. Read.
Há sessenta anos, neste mês — dezembro de 1958 —, um ensaio hoje clássico e conhecido estreou perante o mundo. Intitulava-se “Eu, Lápis”. Escrito como se o autor fosse o sujeito, todos sabemos que não o lápis não o escreveu. Mas, claro, o venerável fundador da FEE, Leonard E. Read. Portanto, se você ainda não leu, por favor, faça-o o mais breve possível. Aliás, pode encontrá-lo aqui.
E como expliquei na Introdução às edições mais recentes do ensaio,
As ideias sempre são muito mais poderosas quando inseridas numa história envolvente. O ponto principal de Leonard E. Read — dificilmente podemos “planejar” economias quando ninguém possui todo o conhecimento e as habilidades para produzir um simples lápis — desdobra-se nas palavras encantadoras do próprio lápis. Leonard poderia escrever “Eu, Carro” ou “Eu, Avião”, mas escolher esses itens mais complexos silenciaria a mensagem. Ninguém — repito, ninguém, não importa quão inteligente ou quantos diplomas acompanhem seu nome — poderia criar do zero um pequeno lápis para o dia a dia. Muito menos um carro ou um avião.
“Eu, Lápis”
“Eu, Lápis” ensina vários princípios: um simples lápis não é tão simples assim. Como você e eu não conseguimos fazer um sozinhos, estamos fumando maconha (e da ruim) se achamos que realizaremos sozinhos coisas mais complexas. Mas também a humildade intelectual é necessária para entendermos o mundo e abraçarmos o crescimento pessoal. Assim como a liberdade é necessária se esperamos que as invenções e a produção materializem-se. Ao incentivar a cooperação entre pessoas distantes e que não conhecem-se pessoalmente, os mercados realizam milagres a cada momento. Todos os dias.
Antecipando a ocasião do aniversário, reli “Eu, Lápis” pela enésima vez. Meu propósito era explorá-lo em busca de quaisquer insights adicionais que não apreciei completamente antes. E, de fato, encontrei um. Está neste trecho:
Se houver alguém ciente de que esses conhecimentos naturalmente, portanto, automaticamente, eles se organizarão em padrões criativos e produtivos em resposta à necessidade e demanda humana. Isto é, na ausência de controle governamental ou de qualquer outra natureza coercitiva. Então possuirá aquele ingrediente absolutamente essencial para a liberdade: a fé em pessoas livres. A liberdade é impossível sem essa fé.
Linguagem forte. Leonard identifica a “fé em pessoas livres” como mais do que simplesmente mui importante para a liberdade. Conquanto a identifica como indispensável. Sem fé, sem liberdade. Isso pode ser literalmente verdade ou ele estava exagerando?
A Fé não é apenas uma Crença Desinformada?
Alguns podem descartar tal discurso como um absurdo místico. Em certos círculos intelectuais, é dado como certo que “fé” é anticientífica, talvez até anticientífica. Essa visão é mais frequentemente associada a críticas a uma religião ou outra (ou a todas as religiões). Leonard E. Read usa o termo num contexto especial: o foco da “fé” está no que as pessoas livres farão, e não em um Ser Supremo. Mas os dois não são tão diferentes. Cada tipo de fé representa uma crença firme em algo para o qual pode parecer, no momento, não haver prova incontestável. Ou seja, nenhuma evidência concreta ou incontestável derivada de nossos sentidos, e cada um é crido com convicção especialmente forte.
Cientistas empregam lógica humana, razão e padrões objetivos de evidência para determinar “provas”. Mas eles conjecturam, levantam hipóteses e extrapolam o tempo todo. E os bons entendem, como disse o astrônomo Carl Sagan, que “ausência de evidência não é evidência de ausência”. Presumir que ela não existe se não podemos vê-la, tocá-la ou ouvi-la, é arrogante e presunçoso. Afinal, ser cego e surdo não significa que não haja coisas para serem vistas e ouvidas.
Um crítico da afirmação categórica de Leonard É. Read sobre “fé em pessoas livres” poderia dizer que o passado não é um prólogo. Asism como o futuro é incognoscível e que nada no passado garante algo sobre o futuro. Talvez as pessoas livres não empreendam as atividades criativas e produtivas que Leonard nos garante que realizarão. Pois podem decidir em massa tirar férias permanentes. Então, talvez seja necessário deslibertá-las para fzerem as coisas. Ou seja, alguém terá que estalar o chicote.
Cuidado com os autoungidos
Nesse ponto, a fé não se evaporaria. Seu objeto seria simplesmente transferido das pessoas livres para aqueles com o poder. Isto é, os planejadores centrais, os sabe-tudo, os autoproclamados que reivindicam para si o direito de governar os outros. Sem garantia de desempenho futuro (e provavelmente com penalidade mínima pela falta dele). Esses conspiradores com poder exigiriam que o resto de nós tivesse fé em sua sabedoria.
Não, obrigado! Pois como disse o falecido William F. Buckley Jr.: “O governo não pode fazer nada por você, exceto na proporção em que pode fazer algo por você”. Frédéric Bastiat, autor de The Law, no qual Leonard E. Read desempenhou um papel fundamental em levar ao público do século XX, disse ainda melhor:
Se as tendências naturais da humanidade são tão ruins que não é seguro permitir que as pessoas sejam livres, como é que as tendências desses organizadores são sempre boas? Os legisladores e seus agentes nomeados não pertencem também à raça humana? Ou acreditam que são feitos d’um barro mais fino do que o resto da humanidade? Os organizadores sustentam que a sociedade, quando deixada sem direção, precipita-se para a sua destruição inevitável, porque os instintos do povo seriam muito perversos. Mas, os legisladores alegam interromper esse curso suicida e dar-lhe uma direção mais sensata. Portanto, aparentemente, os legisladores e organizadores receberam do Céu uma inteligência e virtude que os colocam além e acima da humanidade. Sendo assim, que mostrem seus títulos a essa superioridade.
Eles seriam os pastores sobre nós, suas ovelhas. Certamente, tal arranjo pressupõe que sejam naturalmente superiores ao resto de nós. E certamente, temos pleno direito de exigir dos legisladores e organizadores provas dessa superioridade natural.
Entretanto, é claro que jamais aparesentaram tal prova (muitas alegações, sim, mas nenhuma prova). Muito pelo contrário, o histórico dos autoproclamados é péssimo. Se eles não estiverem corrompidos antes de chegarem ao poder, então o poder certamente os corromperá. Pois sempre prometem omeletes, mas só quebram ovos.
Leonard E. Read compreendia a natureza humana básica
Por outro lado, a fé em pessoas livres enraiza-se em nossa melhor compreensão da natureza humana básica: homens e mulheres agem para melhorar seu bem-estar. Fazem-no criando riqueza e oferecendo-a a outros em troca, e respondem a incentivos e desincentivos. A grande maioria obtém satisfação não somente com a utilidade proporcionada por bens e serviços. Mas também com a alegria que advém do ato de criar riqueza. Libertem suas energias criativas e eles as põem em prática!
A fé de Leonard E. Read nas pessoas livres também possui histórico que supera em muito quaisquer dos seus defensores. Algo patente aqui num antigo ensaio escrito pelo falecido John C. Sparks, ex-presidente e administrador de longa data da FEE. Publicado pela FEE em 1954 e novamente em 1977. Conquanto reforça brilhantemente o apelo de Leonard para confiar no que as pessoas livres podem realizar:
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Se os homens fossem livres para tentar
por John C. Sparks
A propriedade privada, a iniciativa privada, a esperança de recompensa e a expectativa de realização sempre foram as principais responsáveis pelo avanço da humanidade. O progresso contínuo — seja espiritual, mental ou material — baseia-se diretamente em uma melhor compreensão da ideia de liberdade individual de escolha e ação, com responsabilidade pessoal pelas próprias decisões.
Para ilustrar essa ideia, vamos supor que você tivesse vivido em 1900 e, de alguma forma, se deparasse com o problema de buscar uma solução para qualquer um dos seguintes problemas:
Os sete problemas
- Construir e manter estradas adequadas para o uso de meios de transporte, seus operadores e passageiros;
- Aumentar a expectativa de vida média em 30 anos;
- Transmitir instantaneamente o som de uma voz falando de um lugar para qualquer outro ponto ou para qualquer número de pontos ao redor do mundo;
- Transmitir instantaneamente a réplica visual de uma ação, como uma posse presidencial, para homens e mulheres em suas salas de estar por toda a América;
- Desenvolver uma prevenção médica contra a morte por pneumonia;
- Transportar fisicamente uma pessoa de Los Angeles para Nova York em menos de quatro horas;
- Construir uma carruagem sem cavalos com as qualidades e capacidades descritas no último folheto de propaganda de qualquer fabricante de automóveis.
Sem dúvida, você teria escolhido o primeiro problema como a solução mais fácil. Aliás, os outros problemas teriam parecido fantásticos e muito provavelmente teriam sido rejeitados como fruto da imaginação fértil de alguém.
Agora, vejamos quais de tais problemas foram resolvidos até agora. O problema mais fácil foi resolvido? Não. Porém, resolveu-se os problemas aparentemente fantásticos? Sim, e dificilmente pensamos neles duas vezes.
Não é por acaso que soluções foram encontradas aonde quer que prevalecesse a atmosfera de liberdade e propriedade privada, permitindo que os homens experimentassem suas ideias e tivessem sucesso ou fracasso com base em seus próprios méritos. Também não é por acaso que a força coercitiva do governo — quando vinculada a um campo criativo como o dos transportes — tenha sido lenta, laboriosa e pouco imaginativa na manutenção e substituição de suas instalações.
Uma Estrada Melhor
Não parece estranho uma empresa automobilística privada achar conveniente patrocinar um concurso nacional com prêmios extraordinários e conduzir sua própria busca para corrigir as falhas do sistema rodoviário público e inadequado? O dilema das rodovias tornou-se cada vez mais agudo até que alguém além do proprietário público buscou uma solução. Ademais, se ibvertessem os princípios de propriedade em 1900 — com o desenvolvimento do automóvel nas mãos do governo e as rodovias deixadas para indivíduos privados —, provavelmente nós participaríamos d’um concurso patrocinado pelas empresas rodoviárias privadas. Por conseguinte, para sugerir como melhorar a carruagem sem cavalos do governo para acompanhar o ritmo das excelentes e mais do que adequadas rodovias.
Como construíríamos e operaríamos estradas privadamente? Não sei. Pois trata-se d’um assunto ao qual nenhum de nós direciona sua atenção criativa. Nunca pensamos criativamente em qualquer atividade impedida pelo governo. Mas somente quando liberta-se uma atividade do monopólio governamental é que o pensamento criativo começa a agir.
De volta a 1900
Mas voltemos a 1900. Será que algum de nós explicaria como resolver os seis problemas para os quais encontrou-se soluções? Por exemplo, suponha que alguém, naquela época, descrevesse a aparência e o desempenho do último modelo de automóvel. Será que algum de nós diria-lhe como fabricá-lo? Não. Assim como não descreveríamos como construir e operar rodovias privadamente hoje em dia.
Portanto, o que explica o automóvel atual e outras conquistas “fantásticas”? O governo não impediu essas atividades! Em vez disso, deixou-as ao campo do pensamento criativo, livre e desinibido. Assim sendo, empregou-se milhões de horas-homem de pensamento inventivo e tecnicamente qualificado. E o fim ainda não chegou. Nem haverá fim enquanto a influência inibidora do governo limitar-se às suas funções próprias de proteger igualmente a vida, a liberdade e a propriedade de todos os cidadãos. Mas só enquanto houver homens livres para testar suas ideias num mercado competitivo e voluntário.
Publicado originamentel na FEE, intitulado “Faith in Free People“. Traduzido por Roberto Lacerda Barricelli, Título contextualmente adaptado.