A liberdade de expressão do comediante Graham Linehan infringe a lei do Reino Unido
Em 1º de setembro, ao pousar no Aeroporto de Heathrow, prenderam o comediante Graham Linehan. Contudo não por um, nem por dois, mas por cinco policiais armados, sob suspeita de “incitação à violência”. Qual o crime que o famoso roteirista de comédia, criador de Father Ted e The IT Crowd , cometeu? Deve ser especialmente grave para cinco policiais interceptá-lo no aeroporto mais movimentado da Grã-Bretanha. Talvez contrabando de drogas, ou por pertencer a uma célula que organizava um ataque terrorista.
Na verdade, tratava-se de uma série de postagens no X (antigo Twitter). O conteúdo dessas postagens era principalmente sobre pessoas transgênero, com a mais citada sugerindo que mulheres deveriam confrontar mulheres-trans em espaços exclusivos para mulheres. Ademais, com afirmações como “Chame a polícia e, se tudo mais falhar, dê um soco no saco dele“. Rude? Sim, mas isso não é ilegal (ainda). Ofensivo? Talvez. Criminoso? Aí está o problema.
Leis Abusivas?
A prisão, previsivelmente, causou repercussão no Atlântico, assim como nas páginas do The Atlantic. Pois trata-se d’uma questão de liberdade de expressão e uma “clara indicação de excesso de autoridade do Estado”. Independentemente da sua posição sobre liberdade de expressão, pareceu um pouco exagerado confrontar Linehan com cinco policiais.
Há menos de um mês, o vice-presidente JD Vance alertou contra a possibilidade de o Reino Unido trilhar o “caminho obscuro” da censura. Com a entrada em vigor da Lei de Segurança Online, que permite “a censura de imagens de protestos em plataformas importantes como a X, sob a alegação de que podem incitar danos ou encorajar a violência”. Questionou-se a crescente hostilidade do Reino Unido à liberdade de expressão, necessária para o desenvolvimento de uma sociedade civil vibrante.
As mídias sociais são realmente o ponto crucial desse debate em nosso país. Conquanto no ano passado, 30 prisões ocorreram ao dia na Grã-Bretanha por “mensagens ofensivas online“, totalizando pouco menos de 11.000 ao longo do ano. Parte do motivo é a complexa rede de leis que não conseguiu acompanhar a natureza mutável da comunicação digital. Por exemplo, a Lei de Comunicações Maliciosas (1988), aprovada numa época que o e-mail era luxo, tornando crime envirar mensagens “indecentes ou grosseiramente ofensivas” ou com intenção de causar danos.
Fundamentalmente, o ato de enviar a mensagem constitui o crime. Entretanto, ainda mais consolidado na Lei das Comunicações (2003), que especificou na Seção 127 ser ilegal “enviar mensagem ‘grosseiramente ofensiva, indecente, obscena ou ameaçadora'”.
Comediante preso por Agenda Trans?
No tópico específico do transgenerismo, a Grã-Bretanha trilha uma linha estranha. Pois em abril, a Suprema Corte britânica decidiu que definições biológicas de “homem” e “mulher” também são definições legais conforme delineadas na Lei da Igualdade (2010). Porém, a qual ativistas antitrans (ou críticos de gênero) como o comediante Linehan, assim como J.K. Rowling, Helen Joyce e a Professora Kathleen Stock, celebraram. Mas também a razão pela qual o comediante Linehan postou sobre issio. Afinal, a essa altura, legalmente estabeleceu-se que indivíduos transgêneros deveriam, por exemplo, usar os banheiros aos quais seu sexo biológico relaciona-se.
Mas consideraram seus comentários crimes passíveis de prisão pela Lei de Ordem Pública (1986). Ostensivamente redigida para lidar com tumultos e conflitos nas ruas; seu amplo texto inclui incitação à violência e discurso “ameaçador” e “abusivo”. Todavia, obviamente, conceitos subjetivos; e o observador comum notará quais manifestantes que gritam não são presos e quais comentaristas controversos nas redes sociais acabam presos.
A liberdade de expressão tornou-se um tema obscuro na Grã-Bretanha e, absurdamente, uma posição que indica onde no espectro político você encontra-se. A citação de Evelyn Beatrice Hall, frequentemente atribuída erroneamente a Voltaire, de que “Posso discordar do que você diz. Mas defenderei até a morte seu direito de dizê-lo” quase sempre usa-se neste debate. Embora a última metade talvez seja hiperbólica, a essência da mensagem é sólida. Ou seja, discorde o quanto quiser, mas regular a expressão é catraca que só gira numa direção. Por isso, todos devemos ser liberais na questão da liberdade de expressão, porque ao estabelecermos o precedente de controlar aquilo que as pessoas dizem e os meios para fazê-lo, tais poderes podem muito bem voltar-se contra nós.
Crítica do Comissário de Polícia
Por conseguinte, até o Comissário da Polícia Metropolitana, Sir Mark Rowley, criticou o uso da força policial para policiar o que chamou “debates tóxicos de guerra cultural“. Também afirmando que os policiais estão “entre a cruz e a espada” sob a lei vigente. Bem recebido que ele sugira que a polícia não deveria arbitrar questões de discurso. Mas será que a defesa de que os policiais simplesmente fizeram o que ordenaram-lhes é suficiente?
No fundo, Linehan é um comediante. Portanto, fazia piadas numa plataforma famosa por seu humor cáustico, sobre questão que estava (ele acreditava) legalmente resolvida. Policiar o humor e um comediante é algo que pensávamos ter eliminado na Grã-Bretanha; mas se a polícia é forçada a agir por causa de nossas leis ruins. Então, talvez, precisemos corrigir tais leis precisem. Ou melhor ainda, eliminá-las de vez.
Publicado originalmente na FEE, sob o título “Comedian Arrested at Heathrow for Edgy Tweets“. Traduzido por Roberto Lacerda Barricelli.