Qual o Caminho Agora para o Japão?

Japão, Inc., à beira do abismo; o modelo antes considerado aquele a seguir, colhe os frutos da dependência estatal sobre a economia japonesa

Muitos saudaram a recente recuperação econômica do Japão após vários anos de contração. Mas, na melhor das hipóteses, as circunstâncias atuais são frágeis. Em agosto de 2025, a economia japonesa, quinta maior do mundo em PIB nominal e paridade de poder de compra, demonstrava recuperação frágil. Conquanto prejudicada pela dependência excessiva da intervenção governamental: o crescimento do PIB é fraco — estável no primeiro trimestre e apenas marginal no segundo. Logo, escapando com dificuldade da recessão.

Lições recentes

As lições do passado devem ser levadas em conta se quisermos que a situação econômica do Japão seja conduzida inteligentemnte. Pois a intervenção estatal funcionará no curto prazo, mas sufocará o dinamismo e o crescimento no longo prazo.

Para entender o que está em jogo, vale a pena relembrar a trajetória econômica do Japão após a devastação da Guerra do Pacífico. Da década de 1960 ao final da década de 1980, o Japão surpreendeu o mundo com seu crescimento industrial de alta tecnologia, impulsionado pela exportação. Era na qual via-se o Japão como modelo para nações que trilhavam seus próprios caminhos por meio do progresso tecnológico. Aliás, combinando as tradições do passado com as oportunidades de modernização. “Japão, Inc.” tornou-se sinônimo de eficiência implacável, cultura corporativa disciplinada e casamento hábil entre orientação estatal e inovação privada.

Entretanto, a bolha de ativos da década de 1980, alimentada por políticas monetárias frouxas, colapsou na década de 1990, inaugurando as “Décadas Perdidas” de deflação. Com crescimento lento e repetidas intervenções fiscais e monetárias.

Desafios do Japão Contemporâneo

Desde então, a política econômica apoiou-se fortemente em taxas de juros baixas, obras públicas e subsídios direcionados para impulsionar o crescimento. Embora tais ferramentas às vezes evitaram recessões mais profundas, também fomentaram dependência do apoio governamental, enfraqueceu as reformas de produtividade.

Os desafios atuais do Japão são a longa sombra desse ciclo: envelhecimento demográfico, escassez estrutural de mão de obra e déficits públicos insustentáveis. Porém, situação com a qual outras nações desenvolvidas familiarizam-se profunda e desconfortavelmente e, indubitavelmente, observam como o Japão navega para sair — ou não. Um dos primeiros-ministros mais famosos do Japão, Shinzo Abe, implementou estratégias (comumente conhecidas como “Abenomics”) nos anos 2010, injetando estímulos e alguma desregulamentação. Mas o planejamento central arraigado impediu a recuperação total.

Por enquanto, o consumo privado salva a recuperação da economia, impulsionado por ganhos salariais e mercados de trabalho aquecidos. Contudo, atenua-se esse sentimento pela persistência de preços altos, além de que FMI elogiou a aceleração do crescimento impulsionada pelos salários em 2025. Mas alertou à reconstrução das reservas fiscais, pelo aperto das condições, criticando a postura governamental monetária frouxa prolongada, por distorcer os mercados.

Recuperação do Japão: Regra ou Exceção?

Três fatores convergem para fazer com que a recuperação pareça mais exceção do que a regra:

Nesse contexto de desaceleração da recuperação e aumento das restrições, o rebaixamento pelo governo da previsão de crescimento para o ano fiscal de 2025 de 1,2% para 0,7% admite implicitamente: a recuperação carece de impulso genuíno.

Mercados Livres: Um Caminho?

Os mercados livres prosperam com clareza, concorrência e dinamismo; a história do Japão pós-1990 mostra como a intervenção prolongada pode gerar cautela. A desvalorização de 50% do iene em relação ao dólar desde 2022 (atualmente em torno de JP¥148 por US$1) deve muito a política deliberada.

O Banco do Japão (BoJ), limitado por relação dívida/PIB superior a 230% (inferior ao pico de 258% em 2020), manteve os rendimentos de longo prazo fixos. Portanto, tornando ativos em ienes pouco atrativos em comparação com ativos em dólares americanos, uma estratégia que reflete padrões passados. Assim como juros zero de 1990 prolongaram-se além da utilidade, supimir rendimentos ameaça gerar distorções e impedir reação orgânica do mercado às pressões e oportunidades.

Os exportadores podem comemorar um iene desvalorizado, mas a história alerta ao excesso de confiança. Na década de 1980, os superávits comerciais do Japão mascaravam ineficiências subjacentes que evidenciaram-se pela valorização da moeda após o Acordo do Plaza. Todavia, oposto aproxima-se: inflação importada d’um iene desvalorizado afeta famílias, e empresas dependentes de importações, com custos absorvidos por margens menores ou repassados ​​aos consumidores.

Reformas Urgentes

As previsões do Banco do Japão (crescimento de 0,6% [2025], 0,7% [2026], inflação recuando para 2%) atenuam-se pela consciência do fracasso repetido de recuperações anteriores, após fim dos estímulos. A OCDE observa que, embora os salários e o investimento em máquinas sejam resilientes, a confiança do consumidor permanece sob o cerco da inflação. Mas parlamentares veteranos como Taro Kono defendem grande afastamento da Abenomics, pela combinação de aumentos de juros e reestruturação fiscal. Portanto, ecoando as reformas estruturais há muito adiadas durante as Décadas Perdidas.

Os mercados de ações continuam em alta, o Nikkei atingiu recordes este mês devido à desvalorização do iene eflexibilização das tarifas entre EUA e China. Contudo, já questionado pelas novas tarifas de transbordo). Ademais, altas semelhantes no início dos anos 2000 e meados da década de 2010 dissiparam-se quando reafirmaram-se problemas estruturais. Sendo assim, sem reformas profundas, como flexibilização trabalhista, desregulamentação da construção (especialmente imobiliária) e busca por um Estado mais enxuto, o Japão ameaça repetir esse padrão.

Japão precisa encerrar o Ciclo

Décadas de intervenção protegeram o Japão do colapso,enquanto reduziram sua vantagem competitiva. Obras públicas e o controle da curva de juros deram tempo, mas tempo sem reformas é um luxo caro e apenas adia o problema. Pois mesmo intervenções justificáveis, como investimentos direcionados em infraestrutura ou apoio transitório ao envelhecimento populacional, devem acompanhar medidas de abertura do mercado, gerando ganhos duradouros.

O Japão continua a quinta maior economia do mundo, mas tal escala esconde uma fragilidade subjacente. Conquanto a lição dos últimos 60 anos demonstra: crescimento baseado na abertura e concorrência mostra-se duradouro; crescimento sustentado só pela estrutura estatal é passageiro. A corda bamba ainda é transitória. Mas somente se os legisladores afastarem-se da intervenção reflexiva e confiarem nos mercados para o trabalho pesado.

Originalmente publicado em FEE, sob o título “Which Way Now for Japan?“. Tradução: Roberto Lacerda Barricelli.



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